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SME investe milhões na plataforma Elefante Letrado, enquanto mantém bibliotecas fechadas

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Em uma decisão que tem gerado grande indignação no magistério, a Secretaria Municipal de Educação de Curitiba (SME) decidiu investir milhões na plataforma de leitura digital Elefante Letrado, ao mesmo tempo em que mantém fechadas as bibliotecas escolares e os Faróis do Saber. 

Este movimento levanta sérias questões sobre a alocação de recursos públicos e a verdadeira prioridade dada à educação na cidade. Enquanto milhões de reais são direcionados para uma solução tecnológica que enfrenta desafios significativos de implementação e acesso, os acervos físicos das escolas, que poderiam beneficiar diretamente os alunos, permanecem desatualizados e inacessíveis. 

Esta contradição aponta para uma desconexão preocupante entre as políticas educacionais da SME e as necessidades reais dos estudantes e educadores. Além disso, é mais uma demonstração de que a gestão Greca/Pimentel prioriza a transferência de recursos públicos para as mãos de grandes empresários, em vez de investir no desenvolvimento do magistério e na valorização da carreira das professoras e dos professores.

 

A plataforma Elefante Letrado

Criada em 2014 pela esposa de uma grande empresário do ramo de chocolates, a Elefante Letrado é uma ferramenta digital voltada para estudantes do ensino fundamental I, do 1º ao 5º ano. Presente em 10 estados brasileiros e em cinco estados norte-americanos, a plataforma permite que os alunos escolham e-books para leitura ou audição automática, além de realizar atividades complementares. 

A empresária não possui experiência em educação. Ou seja, trata-se apenas de uma oportunidade de negócio, sem considerar os impactos educacionais mais profundos. Esta falta de visão pedagógica crítica levanta preocupações sobre a adequação da plataforma para atender às necessidades educacionais dos alunos.

 

Problemas com o compartilhamento de dados

A questão do compartilhamento de dados pessoais das crianças sem a devida autorização dos pais é um problema sério que envolve várias camadas de preocupação:

  1. Violação de privacidade: A transmissão de informações sensíveis como nomes, idades e outras informações pessoais dos alunos sem o consentimento dos pais viola princípios básicos de privacidade e proteção de dados. Este ato pode ser considerado uma infração legal, colocando em risco a integridade e segurança das crianças.
  2. Confiança entre pais e escola: A falta de transparência no compartilhamento de dados enfraquece a relação de confiança entre os pais e a instituição educacional. Os pais esperam que as escolas protejam as informações de seus filhos, e essa confiança é abalada quando decisões são tomadas sem sua autorização explícita.
  3. Riscos de segurança digital: Compartilhar dados sem consentimento expõe as crianças a potenciais riscos de segurança digital. Informações pessoais podem ser usadas indevidamente, abrindo portas para problemas como roubo de identidade e exposição a conteúdos inadequados. 
  4. Reconhecimento de voz e privacidade: A plataforma Elefante Letrado cria um banco de voz a partir das gravações das leituras das crianças. Isso levanta sérias preocupações sobre o reconhecimento de voz e a privacidade dos alunos. A coleta e armazenamento de dados de voz sem o consentimento explícito dos pais podem ser vistas como uma violação grave dos direitos de privacidade das crianças, expondo-as a riscos adicionais de uso indevido dessa tecnologia. Além disso, esses dados de voz podem ser utilizados para beneficiar outras áreas de negócio dos empresários, levantando questões éticas sobre o uso comercial das informações coletadas de menores de idade.
  5. Conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD): No Brasil, a LGPD estabelece diretrizes claras sobre o tratamento de dados pessoais, incluindo a necessidade de consentimento explícito dos titulares ou responsáveis legais no caso de menores de idade. O não cumprimento dessa legislação pode resultar em penalidades severas para a instituição responsável.

 

Desafios e críticas

O acesso à plataforma Elefante Letrado pode ser significativamente dificultado pela falta de recursos tecnológicos nas famílias dos alunos. Em um país onde a desigualdade de acesso à tecnologia é evidente, muitos alunos não possuem uma conexão de internet estável ou dispositivos adequados, como computadores ou tablets, para utilizar a plataforma de forma eficaz. Segundo dados do IBGE, cerca de 20% das residências brasileiras não têm acesso à internet, e, mesmo entre aquelas que têm, muitas contam apenas com celulares com acesso limitado. Essa realidade coloca uma barreira substancial ao acesso equitativo à educação digital.

Com os R$ 4,5 milhões investidos na Elefante Letrado, as escolas poderiam adquirir aproximadamente 90 mil livros infantis de qualidade, enriquecendo os acervos das bibliotecas escolares. Essa quantidade de livros seria suficiente para renovar e expandir significativamente os recursos de leitura disponíveis para os alunos, oferecendo uma base sólida de material didático e literário que pode ser acessada por todos, independentemente de suas condições socioeconômicas. As bibliotecas físicas têm a vantagem de serem um recurso inclusivo e universal, ao contrário das soluções digitais que dependem de infraestrutura tecnológica que nem todos possuem.

Além disso, o contrato com a Elefante Letrado inclui a realização de 53 mil testes de fluência de leitura. Esses testes, que utilizam inteligência artificial para avaliar o desempenho dos alunos, representam uma adição à já extensa lista de avaliações que os professores realizam. 

Educadoras e educadores argumentam que essas avaliações são descontextualizadas do planejamento docente. As escolas já realizam avaliações diagnósticas de leitura integradas ao plano de aula, que são mais ajustadas às necessidades e ao desenvolvimento dos alunos. A introdução de mais uma avaliação, imposta de cima para baixo, sem consulta aos profissionais do magistério, é vista como uma medida burocrática que sobrecarrega ainda mais as professoras e os professores sem trazer benefícios evidentes para o processo de ensino-aprendizagem.

A professora responsável pela avaliação terá que gravar individualmente a leitura de cada aluno, o que adiciona uma carga de trabalho considerável. Em salas de aula com 30 ou mais alunos, esse processo se torna logisticamente inviável e pedagogicamente questionável. 

Em muitos casos, a professora terá que interromper o andamento normal das aulas para realizar essas gravações, comprometendo o tempo dedicado ao ensino de outras disciplinas. Além disso, em escolas onde há falta de professores e corregentes, a situação se torna ainda mais difícil. A logística de gravação e avaliação individual exige recursos humanos e tempo que muitas escolas simplesmente não possuem.

Outro ponto crítico é o impacto psicológico e emocional dessa carga adicional sobre docentes e alunos. A constante introdução de novas avaliações pode criar um ambiente de estresse e ansiedade, tanto para os educadores como para os estudantes. Em vez de criar um espaço de aprendizado acolhedor e produtivo, as escolas se transformam em ambientes de pressão constante, onde o foco no desempenho em avaliações padronizadas pode sobrepor-se ao desenvolvimento integral do aluno.

A implementação da plataforma Elefante Letrado, sem o suporte adequado e sem considerar a infraestrutura existente, levanta sérias questões sobre a eficácia das políticas educacionais adotadas pela SME. 

 

Mudanças urgentes

Para o SISMMAC a decisão da SME de investir milhões na plataforma Elefante Letrado enquanto mantém as bibliotecas fechadas revela uma desconexão preocupante entre as políticas educacionais e as necessidades reais das escolas. Em vez de fortalecer a infraestrutura existente, como as bibliotecas escolares, que são fontes essenciais de recursos educacionais, a prefeitura opta por soluções digitais que muitas vezes não são acessíveis a todos os alunos.

Através dessa estratégia de uso das plataformas digitais, os empresários estão se apropriando dos recursos do fundo público da educação, e isso tem tomado proporções gigantescas em alguns estados e municípios. Em Curitiba não é diferente

A administração municipal precisa urgentemente reavaliar suas prioridades. É fundamental que o bem-estar e o desenvolvimento dos alunos estejam no centro de todas as decisões educacionais. Isso inclui assegurar que os recursos públicos sejam utilizados de maneira a promover uma educação de qualidade, acessível e justa para todos. Somente assim poderemos construir um sistema educacional verdadeiramente inclusivo, que valorize tanto a inovação como a equidade, garantindo que nenhum aluno seja deixado para trás.

Fonte: Sismmac

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