GAZETA DO POVO: O financiamento de pesquisas no Brasil relegou as universidades particulares a segundo plano. Do total de bolsas concedidas pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) aos programas de mestrado e doutorado no ano passado, apenas 7% foram destinadas à rede privada, enquanto 93% foram para a pública. Além disso, o número de bolsas nas públicas aumentou 25% nos últimos cinco anos, enquanto nas particulares houve uma redução de 4% na oferta no mesmo período.
Embora essa distribuição esteja diretamente ligada ao maior número de programas de pós-graduação nas universidades do governo – federais, estaduais e municipais concentram 81,7% deles –, a diferença também seria reflexo do mau desempenho dos cursos privados nas avaliações da Capes e da preferência do Ministério da Educação em financiar pesquisa nas instituições públicas.
A quantidade de bolsas fornecidas se dá conforme a qualidade da pós, que a cada três anos é avaliada com uma nota que vai de 1 a 7. Se não se sair bem na avaliação, o programa pode ter o número de bolsas reduzido ou então ser impedido de ampliar o número de beneficiados. Isso quando não é fechado, o que acontece se tirar nota 1 ou 2.
Segundo o pró-reitor de pós-graduação e pesquisa da Universidade de Campinas (Unicamp), Euclides de Mesquita Neto, a baixa qualidade dos programas particulares geralmente ocorre porque custa caro investir em professores capacitados que fiquem a maior parte do tempo fora de sala de aula e laboratórios que não sejam usados só para graduação.
Na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), por exemplo, cada docente custa por mês R$ 14 mil, entre salário e encargos. Desse total, cerca de R$ 5 mil são pagos pela mensalidade dos alunos, o resto sai do bolso da própria instituição. “Para as particulares não compensa investir em algo que não tem resultado imediato que nem sempre resulta em algo concreto”, diz o professor de Políticas Públicas Educacionais da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Angelo Ricardo de Souza.
Segundo ele, outro fator que contribui para a baixa qualidade é que os alunos que pesquisam costumam ser muito assediados por grandes empresas. Se a universidade não oferece bolsa, eles acabam desistindo da pós. De acordo com Souza, isso gera um círculo vicioso, pois o bom estudante se evade, a nota da avaliação da Capes cai e a instituição deixa de receber aquela bolsa.
Preferência
Nos últimos cinco anos, o governo federal tem privilegiado instituições públicas na concessão de bolsas. Até 2007, todos os programas de pós-graduação aprovados e abertos no país recebiam o chamado “enxoval”, que é um recurso financeiro, e mais quatro bolsas da Capes. Depois dessa data, o benefício foi cortado para a rede particular e apenas as públicas permaneceram com ele. “Isso foi contraditório, pois foi bem na época que se ampliou o orçamento para bolsas de pós-graduação no país. Infelizmente o governo resolveu aplicá-lo todo nas públicas”, lamenta o pró-reitor de pesquisa e pós-graduação da PUCPR, Waldemiro Gremski.
Além disso, as públicas ainda contam com outra fonte de recursos: o programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais. Na UFPR, por exemplo, ele financia metade de todas as bolsas de mestrado e doutorado.
Particulares optam por investir em cursos mais baratos
Embora tenham recebido menos bolsas do governo federal, as universidades particulares ampliaram em 30% a quantidade de programas de pós-graduação. Esse aumento, porém, foi principalmente na área de Humanas, mais barata que as consideradas áreas “duras”, como Saúde e Tecnologia, que acabam sendo o foco das instituições públicas. “Isso contribui ainda mais para a opção do governo, pois são justamente essas áreas que, pelo senso comum, garantem o avanço e o desenvolvimento tecnológico e científico de um país”, explica o professor de Políticas Públicas Educacionais da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Angelo Ricardo de Souza.
Aliado a isso, existe a ideia de que o recurso público para ensino e pesquisa deve se manter em instituição pública, o que deixa as particulares à mercê do investimento de grandes empresas, o que nem sempre acontece. “Mensalidade não paga pesquisa, principalmente nas áreas de maior custo, e é difícil conseguir empresas que financiem. Então, o recurso fica concentrado nas grandes financiadoras do governo”, diz o pró-reitor de pós-graduação e pesquisa da Universidade de Campinas (Unicamp), Euclides de Mesquita Neto.
Com ou sem fim lucrativo
Dentro da rede particular existe uma diferença crucial que interfere no volume de recursos destinados à pesquisa: universidades sem fins lucrativos, caso das confessionais (de orientação religiosa), geralmente têm mais condições de investir em programas de pós-graduação do que instituições que visam ao lucro. Por isso, as Pontifícias Universidades Católicas (PUCs) de todo o país estão no topo do ranking das instituições privadas que mais produzem pesquisa.
Entretanto, independentemente do direcionamento do lucro, diante da Capes todas são iguais e vistas como integrantes da rede privada. “É incoerente que o governo deixe de lado também as confessionais, pois elas produzem muita pesquisa e têm notas de avaliação muito próximas das públicas”, comenta o pró-reitor da PUCPR Waldemiro Gremski.
A Universidade Positivo (UP), que tem fins lucrativos, tem exatamente o número limite de programas de pós-graduação que o MEC exige (quatro mestrados e dois doutorados) para que seja reconhecida como universidade. Como não recebe auxílio da Capes, não consegue ampliar seu número de cursos. “Tivemos de criar bolsas próprias para os nossos alunos. Se tivéssemos ajuda do governo, certamente a quantidade de programas seria maior”, diz o reitor da UP, José Pio Martins.