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Antes dos ataques às escolas, vieram os ataques aos professores nas redes sociais

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Desde o ano passado, o Brasil vive uma espécie de epidemia (inédita no Brasil) de ataques em escolas. Enquanto as polícias dos estados se esforçam para, apressadamente, tentar classificar cada ação como uma coisa isolada, fruto do que seria um “surto psicótico” dos autores, nós, que vivenciamos no dia a dia as dificuldades da educação pública, precisamos apresentar outras reflexões muito mais complexas.

Não é preciso muito esforço para lembrar que esse tipo de situação não fazia parte do cotidiano do nosso país até pouco tempo. Enquanto nos Estados Unidos esse problema social vem de longa data pela cultura armamentista, com centenas de ataques com armas de fogo em escolas a cada ano, no Brasil esse tipo de ocorrência era raríssimo.

Mas isso foi antes do extremismo político se espalhar como um câncer no meio dos brasileiros.


Precedente: o ataque aos professores nas redes sociais

Vendo o “padrão” dos ataques às escolas, é inegável que as professoras estão entre os alvos prioritários, mesmo nos casos em que o jovem que comete crimes se diz vítima de bullying de colegas. Por que eles transferem para as professoras sentimentos e angústias que explodem em violência extrema?
Para entender o que vem ocorrendo em nosso país, precisamos voltar um pouco no tempo.

Durante as ocupações das escolas públicas paranaenses contra a proposta do Novo Ensino Médio do governo Temer, em 2016, militantes da milícia extremista chamada MBL (Movimento Brasil Livre) vieram para o Paraná gravar vídeos atacando as escolas públicas, estudantes e professores.
Naquela época, eles já haviam compreendido que as redes sociais são muito eficazes para espalhar mensagens de ódio.

A partir dali, ofensas contra professoras se tornaram cada vez mais corriqueiras no meio da militância de extrema-direita. Durante as eleições de 2018, o então candidato Jair Bolsonaro adotou os mesmos discursos, criminalizando professores e espalhando mentiras para que seus seguidores direcionassem o ódio contra as profissionais da educação.

O termo “professores doutrinadores” se tornou um tipo de mantra entre os extremistas, repetido à exaustão para convencer a sociedade que professores estariam fazendo algo errado ao incentivar estudantes a pensar criticamente (sendo que isso é valorizado justamente em países onde a educação é considerada a melhor do mundo, como na Finlândia, por exemplo).

A isso, somaram outros termos para criminalizar professoras e professores: bandidos, criminosos, traficantes ou “comunistas” (uma paranoia infantilizada, com 70 anos de atraso, mas que voltou a ser disseminado para que as pessoas tenham pavor de algo que elas nem sabem o que seria). Enfim, o objetivo é taxar professoras e professores como “inimigos das famílias”. Esse foi o ovo da serpente.

Origem comum (e quem lucra com isso?)

Nos dois últimos anos, houve mais ataques em escolas do que nos 17 anos anteriores somados. Agora, os casos estão sendo praticamente diários.

Esses ataques recentes, apesar de ocorrerem em localidades diferentes, têm uma origem em comum: o extremismo, propagada pelas redes sociais e aplicativos de mensagem.

Os jovens criminosos consomem conteúdos de ódio e discursos paranoicos que, muitas vezes, apresentam a violência como única solução para frustrações ou quando se sentem humilhados. Da mesma forma, são incentivados por pais e mães que também consomem esse tipo de conteúdo e os reproduzem em casa.

É uma combinação explosiva: jovens influenciados em casa ou nas redes sociais, que aprendem que professoras e professores são inimigos, são estimulados a cometer esses crimes. Muitos desses jovens afirmam que sofriam exclusão na escola e, por isso, resolveram se vingar. É importante entender que essa exclusão, muitas vezes, ocorre porque esses mesmos jovens não conseguem mais se relacionar com colegas justamente por terem se tornado multiplicadores de discursos extremistas.

Mas há componentes políticos mais profundos na origem desses crimes.

Nos últimos anos, militantes extremistas fizeram fama, conquistaram milhões de seguidores nas redes sociais espalhando ódio contra professores, tirando fotos com armamentos pesados, estimulando violência contra opositores. Muitos deles se elegeram deputados ou para outros cargos espalhando mensagens assim, como Jair Bolsonaro e tantos outros de sua base de apoio (lembremos que antes das eleições de 2018, ele mesmo sugeriu que metralhassem seus opositores).

São hipócritas que descobriram que esse discurso, se repetido frequentemente, serviria para criar pânico e paranoias na mente de pais que desconhecem as rotinas das escolas. Infelizmente, parte da população acreditou e passou a replicar essa mensagem dentro de casa, criando a imagem de que professoras e professores seriam “inimigos”.

E o que as pessoas com ódio fazem contra aqueles que considera “inimigos”? Exatamente o que esses jovens e adultos estão fazendo ao atacar escolas: focam em professoras com quem, muitas vezes, nem tinham contato, simplesmente pelo fato de serem professoras.
Portanto, não há como separar isso que vem acontecendo do estímulo ao ódio contra professoras e professores que Bolsonaro, os membros de seu governo, seguidores e apoiadores espalharam durante tanto tempo, e continuam espalhando.

E agora, hipocritamente, eles mesmos apresentam como solução contratar empresas privadas de segurança, para lucrarem com essas tragédias (sendo que segurança é dever do Estado). Convém investigar se esses mesmos políticos têm ligações financeira com empresas desse setor para agirem como garotos propaganda (da mesma forma como fazem quando discursam a favor das armas). Isso é difícil de rastrear, já que propinas assim geralmente não são pagas com dinheiro ou cheque em conta bancária, mas de outras formas, como joias caras, por exemplo.

Daqui pra frente

A violência só está acontecendo em escolas públicas? Não. Ataques estão acontecendo em escolas e creches particulares também. Ver centenas de jovens que, ao repetir discursos de ódio em massa contra um candidato a presidente nas vésperas das eleições do ano passado, também agrediram verbalmente professoras da instituição, como ocorreu em diversos colégios particulares de classes média e alta em Curitiba, deve ligar um alerta de toda a sociedade. Provavelmente, a maioria estava reproduzindo o que recebia de estímulo em casa.

A diferença é que, geralmente, as escolas particulares possuem equipes maiores e mais condições de conter casos de violência. Já nas escolas públicas, com seríssima defasagem do quadro de profissionais e infraestruturas precarizadas, é muito mais difícil.

Tanto é que aqui na rede municipal de educação de Curitiba, há inúmeros casos de violência contra professoras, que estão sendo acolhidas pelo SISMMAC, mas nem sempre encontram respaldo por parte da Prefeitura e da Secretaria Municipal de Educação.

Esse é um debate que está apenas iniciando, porque, pela forma acelerada com que esses casos estão acontecendo, tudo indica que estamos vivenciando uma doença social estimulada por grupos políticos que já demonstraram desapreço pela democracia e pela vida em diversas ocasiões.

É preciso responsabilizar criminalmente todos aqueles que estimulam o ódio, a violência e os atentados, assim como as plataformas digitais e redes sociais que, por motivos financeiros ou ideológicos, estão sendo completamente negligentes com os conteúdos publicados, afinal, todos os demais setores econômicos da sociedade são regulamentados e precisam seguir regras claras quanto ao uso de seus serviços.

As autoridades precisam agir agora com muita severidade, assim como as famílias precisam repensar sobre o universo em que estão inserindo seus filhos, porque essa epidemia de violência criada artificialmente por extremistas só será barrada se houver um amplo processo de pacificação da sociedade e a responsabilização de quem está fomentando tudo isso.

Fonte: SISMMAC

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